A expectativa constitui um dispositivo mental poderosíssimo.
Não direi que supera o evento expectado mas altera-o decisivamente. Altera-lhe
o sabor, o cheiro e metamorfoseia-o em algo diferente do evento e acto
originais.
Uma pessoa que aufere um salário mensal de 100.000€ e no mês
seguinte recebe apenas 50.000€ atribuirá a esse evento um valor completamente
diferente daquele que atribui uma pessoa que recebe o salário mínimo e no mês seguinte
recebe de uma raspadinha 50.000€. O evento original é exactamente o
mesmo, receber 50.000€, mas esse mesmo evento experienciado pelo milionário é
completamente diferente, antagónico até, daquele que é experienciado pelo
usufrutuário mensal do salário mínimo e o que os diferencia de forma decisiva é
exactamente a expectativa.
Isto não é novidade e várias são as correntes filosóficas,
ou se não quisermos ir tão longe, as correntes de pensamento que incidem sobre
esta força da expectativa e a pretendem controlar e manietar como forma de
maximização do prazer retirado dos eventos experienciados ou como forma de
minimização do sofrimento absorvido desses mesmos eventos, como o são o “Carpe
Diem” ou o Niilismo, respectivamente.
A novidade digna de relato e o motivo que me leva a escrever
sobre este tema consiste na extrapolação dessa força da expectativa dum campo
pessoal e individual para um campo colectivo e do domínio público, dum campo
meramente introspectivo para o campo político.
A publicação maciça de estados de alma, desejos e intenções,
que até ao arrebatamento destes pelas redes sociais eram do foro íntimo e privado
de cada um, transformaram a vivência e experiência de eventos individuais e
pessoais em eventos colectivos e públicos.
Aludindo ao aqui prefaciado, esses mesmos eventos que antes
eram do foro privado e agora extravasaram para o domínio público são fortemente
condicionados pela expectativa que é gerada em torno desses mesmos eventos e se
aliarmos a esta força da expectativa o apelo de mediatismo e sensacionalismo
que a geração “FACEBOOK” persegue nos flashes das suas “selfies”, percebemos
como um Donald Trump é eleito para presidente dos EUA. Os “millenials”
perseguem o clímax da anti-expectativa, salivam por surpreender, ambicionam à
originalidade dos seus “posts” e à sensação causada nos outros que é sempre
maior consoante menor for a sua conformidade com as expectativas geradas.
Poderia e deveria haver uma designação filosófica para esta corrente comportamental
moderna e contemporânea que conjuga uma forma de niilismo perante todos os
factores potencialmente perturbadores do clímax causado por um “carpe diem”
surpreendente e não esperado, o único digno das “flashadas” das redes sociais.
Assim, quando a ignorância, racismo e sexismo de Donald
Trump criam a expectativa de umas eleições pré-determinadas pela sua derrota
ameaçando, dessa forma, o clímax de um “carpe diem” surpreendente ambicionado e perseguido, eis que esta geração das redes sociais exacerba o seu
niilismo num bloqueio mental e intelectual a esses factores em defesa de um “WOW”
final e do orgasmo cataclísmico de um “Carpe Diem” digno de milhões de posts e
milhões de twits.
Pergunto o que se falou de Donald Trump nas redes socias
desde a sua vitória? Pergunto o que se teria falado de Hillary Clinton tivesse esta ganho? Aí está um bom motivo para a vitória de Trump…
É por isso com agrado que sou confrontado com as
expectativas do mundo actual nas vitórias da extrema direita em França, na Holanda
e no seu ressurgimento um pouco por todo o mundo “desenvolvido”, munido que
estou da crença nesta geração sedenta do surpreendente, do diferente, do choque
da anti-expectativa digna de registo “postado” ou “twittado” com que alimenta o vício social da sua dependência sociológica.