quarta-feira, 30 de novembro de 2016

A força das expectativas e a expectativa do mundo actual

A expectativa constitui um dispositivo mental poderosíssimo. Não direi que supera o evento expectado mas altera-o decisivamente. Altera-lhe o sabor, o cheiro e metamorfoseia-o em algo diferente do evento e acto originais.

Uma pessoa que aufere um salário mensal de 100.000€ e no mês seguinte recebe apenas 50.000€ atribuirá a esse evento um valor completamente diferente daquele que atribui uma pessoa que recebe o salário mínimo e no mês seguinte recebe de uma raspadinha 50.000€. O evento original é exactamente o mesmo, receber 50.000€, mas esse mesmo evento experienciado pelo milionário é completamente diferente, antagónico até, daquele que é experienciado pelo usufrutuário mensal do salário mínimo e o que os diferencia de forma decisiva é exactamente a expectativa.

Isto não é novidade e várias são as correntes filosóficas, ou se não quisermos ir tão longe, as correntes de pensamento que incidem sobre esta força da expectativa e a pretendem controlar e manietar como forma de maximização do prazer retirado dos eventos experienciados ou como forma de minimização do sofrimento absorvido desses mesmos eventos, como o são o “Carpe Diem” ou o Niilismo, respectivamente.

A novidade digna de relato e o motivo que me leva a escrever sobre este tema consiste na extrapolação dessa força da expectativa dum campo pessoal e individual para um campo colectivo e do domínio público, dum campo meramente introspectivo para o campo político.

A publicação maciça de estados de alma, desejos e intenções, que até ao arrebatamento destes pelas redes sociais eram do foro íntimo e privado de cada um, transformaram a vivência e experiência de eventos individuais e pessoais em eventos colectivos e públicos.

Aludindo ao aqui prefaciado, esses mesmos eventos que antes eram do foro privado e agora extravasaram para o domínio público são fortemente condicionados pela expectativa que é gerada em torno desses mesmos eventos e se aliarmos a esta força da expectativa o apelo de mediatismo e sensacionalismo que a geração “FACEBOOK” persegue nos flashes das suas “selfies”, percebemos como um Donald Trump é eleito para presidente dos EUA. Os “millenials” perseguem o clímax da anti-expectativa, salivam por surpreender, ambicionam à originalidade dos seus “posts” e à sensação causada nos outros que é sempre maior consoante menor for a sua conformidade com as expectativas geradas. Poderia e deveria haver uma designação filosófica para esta corrente comportamental moderna e contemporânea que conjuga uma forma de niilismo perante todos os factores potencialmente perturbadores do clímax causado por um “carpe diem” surpreendente e não esperado, o único digno das “flashadas” das redes sociais.

Assim, quando a ignorância, racismo e sexismo de Donald Trump criam a expectativa de umas eleições pré-determinadas pela sua derrota ameaçando, dessa forma, o clímax de um “carpe diem” surpreendente ambicionado e perseguido, eis que esta geração das redes sociais exacerba o seu niilismo num bloqueio mental e intelectual a esses factores em defesa de um “WOW” final e do orgasmo cataclísmico de um “Carpe Diem” digno de milhões de posts e milhões de twits. 

Pergunto o que se falou de Donald Trump nas redes socias desde a sua vitória? Pergunto o que se teria falado de Hillary Clinton tivesse esta ganho? Aí está um bom motivo para a vitória de Trump…   


É por isso com agrado que sou confrontado com as expectativas do mundo actual nas vitórias da extrema direita em França, na Holanda e no seu ressurgimento um pouco por todo o mundo “desenvolvido”, munido que estou da crença nesta geração sedenta do surpreendente, do diferente, do choque da anti-expectativa digna de registo “postado” ou “twittado” com que alimenta o vício social da sua dependência sociológica.       

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