sábado, 2 de abril de 2016

Adeus Cuba!

Numa altura em que o Capitalismo definha no seu terminal estágio de Último Reduto e se encontra aberta a vaga para modelo socioeconómico do mundo, os mais recentes eventos em Cuba (com a visita de Obama e o concerto dos Rolling Stones) prenunciadores de um processo de abertura deste regime a ocorrer num futuro próximo, não podem deixar de ser vistos e encarados como uma capitulação e rendição do Comunismo e uma admissão, por parte do seu maior embaixador, que este não será o modelo a ocupar essa mesma vaga.

Depois de muito resistir e subsistir a um embargo e isolamento históricos, não deixa de ser curioso (e revelador da incapacidade comunista) ser exactamente no momento de maior fragilidade e vulnerabilidade do Capitalismo, com as suas débeis estruturas financeiras e os seus alicerces imobiliários com fissuras que ameaçam o desabamento e colapso, ser exactamente neste período de debilidade capitalista em que se anseia por uma solução alternativa, que o último bastião comunista capitule perante o bastião capitalista e lhe abra as suas portas, com o desejo mal disfarçado de lhe abrir muito mais… O início do fim do embargo e isolamento cubanos, simbolizado pelos eventos acima referidos, significa tão somente a admissão de Cuba aos mercados de bens e serviços mundiais, aos mercados financeiros e de capitais do mundo ocidental e capitalista e o facto de tal admissão ser desejada por Cuba significa tão somente a capitulação comunista e a confissão do seu maior prossecutor de que este não é nem nunca será o modelo socioeconómico capaz de providenciar a qualidade de vida, em termos económicos e sociológicos, por que as pessoas anseiam.

Sendo Cuba o último reduto do Comunismo, o único caso de algum sucesso relativo e o reinado mais longo da experimentação comunista, a sua capitulação enfatiza a impraticabilidade da teoria comunista. A teoria comunista, e restrinjo-me aqui à original marxista e não às derivações do seu choque com a realidade nas variantes leninistas e trotskistas, consagra na sua ideologia um estádio de transição, que antecederia o atingimento do estado idílico comunista, a que designa de “ditadura do proletariado”; a ditadura do proletariado designa a fase de transição do modelo anteriormente vigente para o modelo comunista e defende, segundo Karl Marx, que durante esta fase dever-se-á inclusive recorrer à força física e armada de forma a reprimir e eliminar quaisquer agentes e elementos com ligações ao anterior e pernicioso regime não-comunista, porquanto não seria possível atingir o estado igualitário do Comunismo enquanto subsistissem agentes dissidentes e defensores do antigo regime. O insucesso de toda e qualquer experimentação comunista prende-se exactamente com o facto de nunca nenhum destes regimes ter sido capaz de superar este estádio, que supostamente seria de transição, da ditadura do proletariado e ter atingido o estado final do Comunismo; em abono da verdade para com a ideologia marxista, poder-se-á mesmo afirmar que nunca existiu um verdadeiro regime comunista no mundo e que tudo o que houve foram regimes de ditadura do proletariado, que se esgotaram nesta fase transitória sem nunca ter conseguido culminar num verdadeiro estado comunista. Muitas razões podem ser apontadas para esta incapacidade mas a mais premente, subsistente e insuperável enraíza-se na própria natureza humana, que, como definiu Adam Smith (ideólogo contra quem idealizaram Marx e Engels), é essencialmente e fundamentalmente egoísta e individualista e por isso contrária à teoria igualitária e despojada de individualismo preconizada pelo Comunismo.

Cuba terá sido o projecto que mais se aproximou da superação do estágio da ditadura do proletariado e do alcance de um verdadeiro estado comunista mas depois de meio século a combater a natureza humana, a final e anunciada capitulação exclama a insuperabilidade deste estágio que nunca se conseguiu que fosse apenas de transição. Depois de ter sobrevivido à guerra-fria e ter subsistido quando todos os outros pereceram já, Fidel Castro sucumbe “at last” perante o inimigo que a todos os pretendentes comunistas derrotou e derrotará, a natureza humana. Contra ela bastante lutou e nessa luta atentatória dos direitos humanos, por atentar contra a sua natureza, pode levar com ele, como menção honorária, uma população 100% alfabetizada, instruída e educada e um sistema de saúde universal gratuito de cuidado e tratamento humano que a ninguém exclui…Pode levar com ele ter sido quem mais perto esteve de atingir o clímax comunista nunca antes experienciado. Mas levará também, certamente com ele, as mortes e as castrações de liberdades de que foi responsável nesta tentativa utópica de contrariar a natureza humana.


“Se ela pudesse expor os seus sentimentos diria que não era isso o que eles desejavam quando destronaram a raça humana. Estas cenas de terror e assassinato nada se pareciam com o que visionavam naquela primeira noite em que Major lançara as bases para a Revolta. O seu ideal era uma sociedade de animais livres da fome e do chicote, todos iguais, cada um trabalhando segundo a sua capacidade, o forte protegendo o fraco, como ela tinha protegido com a sua pata os pequenos patinhos na noite do discurso de Major. Em lugar disto – e sem saber porquê – agora ninguém podia expor os seus pensamentos sem ser agredido por cães ferozes, e obrigado ainda a ver os seus camaradas feitos em pedaços, depois de confessarem os seus chocantes crimes.” (George Orwell, em “O Triunfo dos Porcos”).         

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